Novas considerações sobre a morte

Davilson Silva-

Não basta só admitir a vida pós-morte, conjeturá-la, esperar por ela na esperança de suposto descanso eterno num hipotético paraíso.

A “morte” é o “último inimigo que há de ser aniquilado”, segundo o Apóstolo Paulo (1.a Carta aos Coríntios, 15:26) que, certamente, quis aludir ao pavor e à antipatia que a morte inspira às criaturas (daí defender alguns a “pena de morte” como expediente para punir, vingar, castigar). O Ser Eterno não se acaba com o corte das forças vitais, o Espírito revestido de corpo físico a quem  também denominamos Alma, quando em sua configuração humana, jamais desaparece. Morte é renascimento depois de certo tempo de perturbação seguida da plenitude da autoconsciência para logo reencontrarmos não anjos nem demônios, e sim aqueles que compartilharam conosco as horas tristes e alegres da curta temporada terrestre.


A Lição da Anatomia do Dr. Nicolaes Tulp, óleo sobre tela, de Rembrandt van Rijn (1606/1669)
“Finados” ou “perdi fulano” são expressões que não fazem sentido para os espíritas (leia as questões: de 320 a 329, de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec). Para os espíritas, “morte” significa transmigração de Almas, ou seja, é o mesmo que alguém se transferir de um lugar para o outro sem nunca esquecer o passado, pessoas. Os verdadeiros laços de amor, de amizade fraterna entre as criaturas jamais cessam com a morte, perpetuam-se através de múltiplas existências, ou reencarnações; pode ter certeza. Esquecemos, sim, ou melhor, procuramos esquecer, aqueles que nada têm a ver conosco e os acontecimentos que nos causem lembranças desagradáveis. Aliás, vínculos relativos somente à interesses materiais terminam exatamente até mesmo durante o transcurso da efêmera existência.

O que é estar encarnado e desencarnado

Mantemos também percepções e outras faculdades obscurecidas pelo véu da matéria. Como costumamos fazer certa analogia a respeito do que é estar encarnado ou desencarnado, imaginemos achando-nos em aprazível viagem de trem pelo campo; dentro do vagão, mesmo na lateral de uma generosa janela, apreciaremos parcialmente a linda paisagem bucólica deixada célere para trás; assim é estar encarnado. Agora, decidamos viajar em cima do vagão. Neste caso, poderemos ver o que está na dianteira, à direita, à esquerda e o que fica para trás; assim é estar desencarnado.

O desencarnado pode surpreender-se pela amargura ou por indizível felicidade no Mundo Espiritual. Sim, só depende dele. Consoante relatos de além-túmulo, via mediúnica, muitos padecem por causa da má postura anterior, faltos da liberdade de pensar, de agir com perspicácia e clareza de inteligência, ao passo que alguns, plenos de liberdade, regozijam-se ao regressarem à dimensão sutil da vida. Para se conseguir realmente tal autonomia, é preciso antecipado preparo, enquanto aqui estivermos, por intermédio do esclarecimento e da reforma moral. Não basta só admitir a vida pós-morte, conjeturá-la, esperar por ela na esperança de suposto descanso eterno num hipotético paraíso.

Destinação celestial

A vida terrena tem igualmente a sua valia. Ela serve de alicerce das coisas essenciais e eternas, da nossa verdadeira destinação que é a celestial. Quem tomar conhecimento sobre a vida futura como algo concreto e conforme as suas consequências morais, por certo, para este, pouco perdurará a desordem psíquica comum a grande maioria dos que desencarnam. Nada estranhando, os Espíritos esclarecidos e bondosos libertam-se logo de todo influxo terrestre e recuperam a consciência de si mesmos. Já os Espíritos maus, orgulhosos e egoístas conservam impressões da vida terrena por muito tempo, julgam viver tal como outrora e continuam, às vezes, durante anos, séculos o simulacro de suas atividades terrenas.

A morte continua a ser incompreensível, angustiosa dúvida para crentes e descrentes. É por isso que além-campa, estes confundem o corpo perispiritual com o corpo material, através de gestos e necessidades imaginárias do âmbito físico, vagando sem rumo atribulados e incertos. Mas, Deus, que é misericordioso, permite sempre o auxílio dos Bons Espíritos para que os esclareçam e compreendam tudo o que se passa, se assim o desejam.

Encerremos nossas considerações com esta notável ilação do filósofo espírita francês Léon Denis, de sua magistral obra O Problema do Ser, do Destino e da Dor: “A maneira por que cada qual sabe morrer é já, por si mesma, uma indicação do que para cada um de nós será a vida no Espaço”.


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